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# O mundo em 2050, segundo Ian Pearson

Entrevista feita entre Rafael Kenski (da revista Superinteressante) e o futurólogo Ian Pearson em novembro do ano 2000.

Uma típica cidade do futuro? (Fonte: Green Prophet.)

“O futurólogo Ian Pearson, um dos gurus mais ouvidos do mundo, acredita que neste século a humanidade irá se fundir às máquinas e ganhar vida eterna.”

O inglês Ian Pearson é formado em Física Teórica e Matemática Aplicada, mas é viajando no tempo que ele ganha a vida. A British Telecom, principal companhia telefônica do Reino Unido, instalou-o em seu laboratório de pesquisas avançadas para imaginar as tecnologias que surgirão daqui a 10 ou 100 anos. Antes, Pearson trabalhou com várias tecnologias. Ele projetou de sistemas de realidade virtual a lentes de contato que funcionam como um monitor de computador. Trocar as ciências exatas pela imprecisão da futurologia parece ter dado certo: as suas previsões inspiraram filmes como Matrix e chamaram a atenção da imprensa.

Qual a sua margem de acerto? O próprio Pearson afirma acertar 85% das previsões feitas para o prazo de 10 anos. Mas se Pearson também estiver certo quanto ao mundo de 2030 ou 2050, prepare-se: ele acredita que as gerações que nascerem a partir de agora poderão viver para sempre. Em entrevista à Super, ele conta por quê.

Super – Teremos uma vida melhor daqui a 25 anos?

Pearson Acho que sim. As novas tecnologias nos trarão enormes benefícios, apesar de embutirem alguns riscos. A engenharia genética talvez nos permita resolver o problema da alimentação no mundo, converter desertos em áreas verdes e reduzir o aquecimento global. Claro que é possível a ocorrência de acidentes, mas eles podem ser controlados e não ocorrerão sempre. Para a maioria das pessoas, o mundo será mais agradável, sim.

Quem está nascendo hoje vai usufruir de que benefícios da engenharia genética quando se tornar adulto?

Ao menos na Europa e nos Estados Unidos, o uso dessa tecnologia em humanos ainda será muito restrito. Poderemos, no máximo, definir se uma criança será menino ou menina ou modificar poucas características. Mas é inevitável que ocorra um grande progresso na engenharia genética de plantas.

Há riscos?

É uma tecnologia perigosa, uma vez que os novos genes podem acidentalmente se disseminar para várias espécies e provocar um impacto significativo em todo o meio ambiente. A genética deveria ser limitada até compreendermos melhor como as espécies que inventamos interagem com o ecossistema. Isso sem falar no uso hostil em guerras, por exemplo.

O que as telecomunicações nos trarão?

A velocidade com que os dados são transmitidos ainda é muito lenta, se comparada com a capacidade de processamento dos computadores. Os sistemas de comunicação vão se acelerar para recuperar a diferença. O que há de mais excitante é a tecnologia móvel. Criaremos uma rede de informação muito rápida ao redor do planeta e, como conseqüência, poderemos ter acesso a todos os recursos do escritório de qualquer país em que estivermos.

A facilidade de obter informações sobre qualquer pessoa, em um mundo capaz de produzir dados em todo lugar, acabará com a privacidade?

Nossa privacidade está diminuindo muito rapidamente. Há uma grande preocupação na Europa em relação à onipresença das tecnologias de informação e as pessoas já fazem campanha para recuperar a privacidade que tinham há alguns anos. Quando caminho por Londres sou filmado por centenas de câmeras espalhadas por toda parte. Computadores registram as mercadorias que você comprou, o valor, a hora e até o local da compra. É muito fácil rastrear tudo o que você fez na vida. Por outro lado, as tecnologias para garantir privacidade também se desenvolvem o tempo todo. Novas formas de criptografia permitem às pessoas enviarem e-mails e passearem pelas redes em segredo. É muito provável que, nos próximos anos, tenhamos mais privacidade na Internet do que na praia. Os governos se alegram em diminuir a privacidade e tentam dominar as tecnologias que a aumentam. Parece-me que a maior parte das pessoas não entende de tecnologia o suficiente para perceber que os governos poderão controlar as atividades de todas as pessoas, do contrário haveria protestos nas ruas.

Teremos medo das tecnologias do futuro?

As pessoas passarão a se assustar quando as tecnologias começarem a ter um impacto significativo no seu dia-a-dia. Elas estão acostumadas com telefones e computadores porque aprenderam a utilizá-los em um processo gradual, que não alterou muito rapidamente o que faziam. Mas a ciência evolui cada vez com maior velocidade e tem enorme impacto sobre o trabalho e o estilo de vida de cada um. Em dez anos, o estresse de acompanhar as mudanças será tão grande que haverá cada vez mais protestos contra as tecnologias. As manifestações que já estão ocorrendo na Europa contra os alimentos transgênicos são só o começo.

Hoje o capital intelectual está em alta. O que movimentará a economia em 2025?

Durante os próximos 15 ou 20 anos permaneceremos na economia da informação, na qual o dinheiro gira em torno de dados, idéias e know-how. Depois dessa fase, computadores processarão informações, terão idéias e desenvolverão conhecimento de forma muito mais barata e rápida do que um humano pode fazer hoje. A inteligência, como a concebemos agora, terá pouco valor. Isso já aconteceu com o trabalho pesado. Há 100 anos, construir um prédio tomava o trabalho de muitas pessoas e era um processo caro. Agora uma ferramenta faz o trabalho de centenas de pessoas, de forma mais barata, mais eficiente e com menos riscos. Da mesma maneira, inteligência e informações serão processadas por computadores. As pessoas se preocuparão apenas com os detalhes. A economia da informação será substituída pela interação humana. O mais valioso serão coisas como as relações humanas, atenção, carinho, entretenimento e esporte.

Que benefícios podemos esperar da nanotecnologia?

Essa ciência irá avançar bastante. Hoje em dia, já manipulamos átomos em experiências e vemos uma grande quantidade de máquinas microscópicas, como os circuitos de um chip de computador. Mas, apesar de parecerem pequenas, até agora só construímos estruturas muito grandes, de centenas de nanômetros. As grandes mudanças acontecerão quando esses objetos encolherem para poucos nanômetros – do tamanho de meia dúzia de átomos.

Para que servirão essas estruturas nanicas?

A aplicação mais interessante da nanotecnologia acontecerá quando pudermos construir máquinas pequenas a ponto de se ligarem diretamente aos neurônios. Poderemos fazer uma conexão entre o mundo das máquinas e o mundo biológico. Nesse momento começaremos a produzir ciborgues, com uma consciência parte humana, parte máquina. Acho que isso deve começar a acontecer daqui a 25, 30 anos.

Quer dizer que as pessoas e as máquinas serão uma coisa só daqui a 25 anos?

Nessa época ainda não será possível fazer uma conexão total. Será apenas o começo. O que poderemos fazer até lá é transmitir o que estamos pensando para as máquinas e ter acesso a elas diretamente por meio do cérebro. O computador poderá saber o que estamos pensando e fazer o que desejamos, como descobrir informações e colocá-las na tela ou informar por voz. Será preciso, no mínimo, mais uma década até conseguirmos receber em nossa mente informações emitidas pelo computador, o que permitirá usar a capacidade de processamento das máquinas para desenvolver os nossos pensamentos e redirecionar a nossa consciência. O que dificultará essa tecnologia é que o conteúdo de cada cérebro é único e não poderemos ligar todas as pessoas às máquinas da mesma forma. Uma conexão completa só será possível depois de 2035, ou até mais tarde, em 2040 ou 2050. O interessante, em futurologia, é você não saber muito bem quando as coisas vão ocorrer. Mas sabemos que elas, de fato, vão acontecer. Quase certamente isso acontecerá no próximo século.

Apesar de todo o avanço da ciência, a humanidade ainda não conseguiu coisas aparentemente prosaicas, como pôr fim a um resfriado. E se for impossível ligar o nosso cérebro às máquinas?

Não vejo barreiras no caminho. Aprendemos mais a cada ano sobre como os neurônios funcionam. Apesar de alguns cientistas dizerem que essa ligação é impossível, conhecemos algumas formas de conectar os nossos nervos a sistemas eletrônicos. Já existem pessoas com chips implantados no cérebro para superar deficiências como cegueira ou surdez.

Os computadores terão emoções para se relacionar conosco, como um robô que funcione como cachorro de estimação?

Já lidamos hoje com computação emocional e damos personalidade e emoções aos computadores. Acho que é inevitável e que vai ocorrer. Muito provavelmente, não serão como as máquinas atuais, que executam cada ação de acordo com uma instrução específica. Elas serão programadas com uma lógica caótica, que formula um novo procedimento para resolver cada problema. Nunca se terá duas vezes a mesma resposta. Diferenças no equilíbrio químico do nosso cérebro nos fazem mudar as nossas respostas de acordo com a situação. Podemos reproduzir esse sistema com computadores. É completamente viável produzir uma emoção sintética. Viveremos em um mundo interessante, em que alguns de nossos amigos serão pessoas e outros, programas de computadores. Serão amizades genuínas, porque terão uma consciência e uma personalidade autênticas e não apenas peças estéreis de programação.

É possível que, um dia, as máquinas sejam mais importantes do que nós?

Isso ocorrerá durante o século XXI. Elas serão mais espertas e poderosas e nós nos tornaremos menos relevantes no que diz respeito ao futuro do planeta. Um grande problema é que as pessoas não dão muito valor ao mundo das máquinas e elas não se importarão conosco também, o que gera um conflito de espécies. Existe a possibilidade de ocorrer um cenário igual ao do filme Exterminador do Futuro, em que máquinas e homens iniciam uma guerra. A possibilidade de sairmos vitoriosos, como no filme, é extremamente pequena, porque somos bem mais vulneráveis. Não me parece uma idéia muito boa desenvolver aparelhos superinteligentes e criar uma enorme diferença entre as nossas capacidades e as delas. O que podemos fazer para nos sentir seguros é conectar o nosso cérebro aos computadores com eficiência antes de desenvolver muito a inteligência das máquinas. É a única forma de adquirir o nível de conhecimento delas. Seria uma precaução bastante sensata.

Então, teremos duas possibilidades: um apocalipse ou um mundo paradisíaco em que sabemos tudo?

O futuro estará em algum ponto entre esses dois cenários. É mais fácil analisar situações extremas do que tentar descobrir exatamente onde será o meio. Teremos muitas das vantagens e talvez muitos dos problemas que aparecem nessas duas possibilidades. Mas é difícil adivinhar que caminho tomaremos porque ainda falta muito tempo até lá.

Hans Moravec, do Instituto de Robótica da Universidade de Carnegie Mellon, em Nova Jersey, Estados Unidos, acredita que o Homo sapiens evoluirá para uma espécie, o Robo sapiens. É possível que isso aconteça?

Sim. Em pouco tempo os robôs farão parte da nossa vida cotidiana. Mas é possível que os achemos muito fracos e que, para melhorá-los, eles sejam conectados a animais ou à consciência humana. Nessa época, já teremos controle sobre o código genético humano e poderemos nos configurar para nos unir mais fácil e diretamente às máquinas. Quando isso acontecer, o Homo sapiens dará origem ao Homo ciberneticus. Nossa memória e pensamentos estarão 99% no ciberespaço. Logo chegaremos à conclusão de que o corpo não é tão importante e poderemos transferir também o nosso lado biológico para o computador sem perder a sensação de ser humano. Essa será a maior de todas as conquistas da nossa espécie. Poderemos fazer inúmeras cópias de nós mesmos, testar personalidades diferentes e ter vários pensamentos ao mesmo tempo. Por estarmos ligados em rede, a humanidade inteira terá acesso a uma mesma consciência. Ao final, poderemos transmitir todo o nosso cérebro para as máquinas e nunca mais morrer. Infelizmente, levaremos, no mínimo, 50 ou 60 anos para atingir isso. É possível que as crianças de hoje vivam eletronicamente para sempre e talvez a minha seja a última geração a morrer. Quem sabe?

Fonte: Revista Superinteressante.

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